Lá estava ela, parada na porta, ofegante. Parecia estar fugindo de alguém, assim como eu que um dia achei ter fugido de sua presença e das lembranças que ela havia plantado na minha mente, no meu corpo e na minha alma.
- Vamos lá, entre! - convidei, contrariado.
Fez o que pedi. Estava envergonhada. Seria por estar recorrendo a alguém, a um cara a quem fez muito mal ou pelo simples fato de - se a conheço bem - estar em uma posição de dependência e inferioridade?
A Vanessa que conhecia jamais se submeteria a situação alguma desse tipo.
- Obrigada e me desculpe por te acordar e incomodar a uma hora dessas.
Cheguei a sentir pena.
- Não direi que não tem problema porque você e eu sabemos o que esse tipo de situação traz à tona e o que pode acarretar. Mas o que seria da minha vida sem um mínimo de confusão, não é mesmo? - disse esboçando um sorriso.
Ela fez o mesmo. Esperava algum tipo de instrução sobre o que deveria e poderia fazer. Definitivamente, não era mesma Vanessa. Isso acentuava a minha desconfiança.
- Bem... Você pode deixar suas coisas aí na minha bagunça. Pode tomar um banho e dormir ali no sofá-cama. Eu vou pro meu quarto. Precisando, bata na porta, mas jamais abra sem minha AUTORIZAÇÃO, entendeu bem?
Fez que sim.
Na manhã seguinte, despertei e percebi que estava na beira da cama, sentada, me olhando com certa admiração:
- BOM DIA! - disse sorrindo.
Nem sequer ouvi. Levantei em um acesso de raiva.
- Mas que PORRA é essa!? Eu não disse que não queria você entrando aqui sem prévia AUTORIZAÇÃO?
- Desculpa! é que eu fiz o café como modo de agradecer o que você fez por mim...
Suspirei.
A raiva se dissipou e deu lugar à vergonha e ao arrependimento por tê-la tratado daquele jeito e, mais ainda, por tê-la deixado voltar à minha vida. DROGA!
Fomos para a cozinha, o cheiro parecia bom. Sentamos juntos e começamos a comer calados, até ela quebrar o silêncio:
- Então, o que tem feito?
Não respondi, o que a deixou bem irritada.
- Ok, então. Já entendi. Vou procurar outro lugar pra ficar. Já vi que aqui não sou bem-vinda. - levantou-se e ameaçou sair da cozinha.
- Vai pra onde? Só se for pra algum puteiro... Porque, até onde sei, você não tem mais amigo algum. - retruquei com rancor nas palavras.
Seus olhos encheram-se lágrimas.
- Talvez isso seja melhor a ficar perto de um idiota que não sabe perdoar nem consegue superar o passado e a rejeição.
- Ah! Cala a boca! - mandei.
- Você é um imbecil, Milton!
Arrumou as coisas rapidamente e saiu. Mas pra onde iria?
Sentei-me, esperando que voltasse com o rabo entre as pernas como um vira-latas sem dono.
Anoiteceu e nem sinal dela.
Fiquei aliviado e preocupado com o que poderia acontecer com ela estando sozinha, à noite, pela rua. Era bonita e a cidade andava cheia de tarados.
Independente do tipo de pessoa que era, sempre conseguia alterar o meu comportamento sem ter ciência disso, pra minha sorte.
Levantei, fui até o quarto, coloquei uma roupa...
Deixei o orgulho na gaveta de meias...
E fui buscá-la.
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