Era por volta da meia-noite. Chegava meio bêbado e resolvi sentar na escada que ficava na porta do prédio.
O edifício tinha cinco andares, morava no segundo,
apartamento 205, entre o cara que batia na esposa e o viciado em crack.
Embora os moradores fossem alternativos, para os
padrões de locais que são antro da vagabundagem, até que o lugar era bem
tranqüilo.
Enquanto aguardava o nível do álcool no meu sangue
diminuir, sentado na escada, a dona Paulete passou. Pude perceber que me olhava
com certo desdém, como a quem olha um vira-latas sarnento e com pulgas a dar e
vender.
Dona Paulete era uma velha de meia-idade que mais
parecia a versão feminina do Mum-Rá e babava feito um são bernardo quando
falava. Morava sozinha. O marido morreu fazia cinco anos e, dizia a dona
Paulete, que o falecido havia deixado uma pensão gorda. Motivo pelo qual ela
tratava todo mundo feito lixo, exceto o pedante intelectual do quinto andar.
Não sei muito mais que isso. Passou a me odiar quando vomitei na sua
porta depois de uma das inúmeras bebedeiras que tive.
Assim que a velha carcomida passou, esperei algum
tempo e resolvi subir para o apartamento. Abri a porta com alguma dificuldade,
mas abri. Entrei, liguei a tv e peguei uma cerveja na geladeira (diz a
sabedoria popular que uma bebedeira cura outra). Passaram-se dez minutos e o
telefone tocou. Relutei em atender, mas fiz. Do outro lado uma voz cansada e
apavorada chamou o meu nome:
- Milton, é você? Milton?
- Xim, xou eu.
Quem estchá falando?
- Milton, sou eu. Sou eu, a... – o telefone chiava
muito.
- Olha moxa,
eu não estchou entendendo nada...
- Sou eu, Milton! Vanessa!
Quando ouvi aquele nome, entendi o porquê daquela voz
não me parecer estranha mesmo estando bêbado. Senti como se um caminhão carregado
de más lembranças tivesse me atropelado:
- Maix o que
voxê quer? – perguntei com um misto
de medo, fúria e álcool.
- Desculpa! Eu não tinha outra pessoa a quem recorrer.
Preciso muito da sua ajuda – implorou.
- Mas porque eu?
- Porque você é uma bom homem, porque, apesar de tudo,
confio em você e...
A ligação caiu. Não tornou a ligar.
Uma hora depois a campainha tocou. Atendi sabendo
quem era, mas desejando que não fosse.
Dizem que quando se chega ao fundo do poço, nada pode
piorar. Só temos a subir.
Não quando se conhece alguém como ela...
Nenhum comentário:
Postar um comentário